O controle sobre a atenção pode ser aprendido

Por: Escola Tistu

|

Artigos de Educação

24 de mar. 2021
O controle sobre a atenção pode ser aprendido

Michele Müller

Conforme explicado no artigo anterior, a atenção concentrada, aquela que precisamos para absorver uma nova informação exige esforço mental e, por isso, é normal que a mente divague para lugares mais cômodos e familiares. Para compensar todo esse despedimento de energia – já que nada custa mais caro que aprender em termos de consumo energético – é necessário haver motivação, estimulando uma série de neurotransmissores que favorecem a atenção. 

Além de didáticas que provoquem a curiosidade da criança, existem uma série de estratégias que podem ser trabalhadas em casa, no dia a dia, e que ajudam a ganhar mais controle sobre a própria atenção e a sustentá-la por mais tempo em tarefas que exigem esforço mental.

É importante que os pais lembrem que, diferentemente dos adultos, as crianças não têm desenvolvida a consciência de seus processos cognitivos e necessitam assimilar uma carga geralmente muito grande de novas informações. Portanto, é preciso, com paciência e perseverança, mostrar a elas que esse controle deve ser aprendido e praticado diariamente.

Abaixo, apresento algumas das táticas que podem ser adotadas em casa para trabalhar a atenção das crianças:


Conte o tempo 

Inclua o uso de um timer nas tarefas que exigem concentração, como estudos e tarefas de casa. 

Ao pré-estabelecermos um tempo para a criança fazer uma atividade, lançamos um desafio, um objetivo que pode ser motivador. O timer não serve para pressionar a criança a fazer a tarefa rapidamente, mas sim para ensiná-la a se concentrar por um período pré-estabelecido. Naturalmente, se ela se mantiver focada, vai concluir as atividades em um tempo menor e pode ser recompensada, tendo seu esforço reconhecido e elogiado.

O ideal é dividir a tarefa em partes e programar o timer para períodos curtos, de cinco a dez minutos, somando, no máximo, 30 minutos antes de um intervalo. 

Entre adultos, o tempo médio de concentração em uma explicação ou tarefa de demanda intelectual é de 45 minutos. Durante o período estabelecido pelo timer, é importante remover do ambiente todos os tipos de distrações – especialmente eletrônicos.

Mesmo para crianças que se mostram muito motivadas por desafios, é sempre importante não lançar objetivos que sejam difíceis de cumprir e causem frustrações. Se ela fica nervosa com a pressão do tempo, é preciso deixar claro que se trata de um período em que deve se concentrar, sem a necessidade de que termine uma determinada questão ou tarefa. 


Mantenha uma rotina

Costumamos associar rotina a algo chato e sem graça pelo simples fato de que é sempre bom sair dela. Para as crianças, que adoram novidades, fazer uma coisa diferente pode ser muito empolgante. Mas para que possamos curtir esses momentos é preciso haver uma rotina a ser quebrada.

Sem isso, os dias passam a ser caóticos, a alimentação e o sono são prejudicados e é muito mais difícil impor disciplina e exercitar o controle da atenção. A relação com a atenção pode não ser óbvia, mas é direta: toda a atividade que requer concentração exige esforço, traz um desconforto que nos leva a adiá-la até o último momento. Mas se temos um período pré-determinado para atividades nas quais precisamos nos concentrar, não damos chance à procrastinação.

Entre crianças, a rotina é uma forma de tirar seu poder de decisão, que pode ser desgastante; de não deixar espaço para que decidam quando farão a tarefa, por exemplo. Isso as poupa de uma ansiedade desnecessária, acionada pela projeção do momento desconfortável de estudo.

As tarefas que fazermos todos os dias no mesmo horário passam a ser automáticas, exigindo um esforço mental menor. Por outro lado, um horário muito flexível e variável para as obrigações também dá margem para que elas lutem contra esse momento não apenas com procrastinação ou distrações, mas com birras e desobediência.

A rotina está relacionada ao comportamento porque se impõe, fecha espaço para negociações e torna-se inquestionável. Quando estabelecemos e seguimos uma rotina, paramos de consultar a vontade e partimos à ação. Trabalhamos, portanto, a autodisciplina, uma grande aliada da atenção. 


Dê ao sono a importância que ele merece

O sono é fundamental para a aprendizagem e quando é prejudicado, a atenção e a memória são inevitavelmente afetadas. Assim, ao criarmos uma rotina mais rígida para as crianças, devemos calcular o tempo necessário de sono e o horário ideal para irem para a cama.

Crianças necessitam de mais sono que adultos. Esse tempo varia conforme a idade e a pessoa, mas é geralmente entre nove e doze horas.

Durante o sono, ocorre o processo de consolidação da aprendizagem. As conexões neurais formadas pelo exercício de habilidades e processamento de informações novas que absorveram durante o dia são reforçadas, enquanto outras mais fracas, de estímulos irrelevantes, são apagadas, preparando o cérebro para novas aprendizagens. 

O ideal é ensinar a criança a ir para a cama sempre no mesmo horário, independentemente de estar com sono ou não. Enquanto não consegue dormir, uma atividade como a leitura de livros ou gibis pode ser encorajada. As telas costumam prejudicar o sono e por isso devem ser desligadas algumas horas antes do horário de deitar.


Use recursos visuais

Outro truque que podemos usar para ampliar o tempo de atenção concentrada da criança é fazermos uso do sistema visual. Nossa visão funciona como o obturador de uma máquina fotográfica, alternando entre o cenário amplo e os detalhes conforme aquilo que escolhemos prestar atenção ou ignorar. E o sistema atencional funciona de forma parecida.

Essa relação entre a visão e a atenção não é apenas uma analogia. São sistemas que podem trabalhar juntos para alcançarmos o objetivo de termos maior controle sobre a atenção. Tarefas que requeiram discriminação e atenção visual, ou seja, atenção aos detalhes, ajudam nessa transição entre o modo de atenção difusa e o de atenção focada – necessário para as tarefas que exigem mais esforço. 

Olhar atentamente para algum detalhe próximo pode ajudar a concentrar nas atividades que requeiram esse foco limitado e intensivo de atenção quando as crianças estão muito dispersivas. Não faltam opções de recursos para isso: brincar de procurar o Wally, jogos de caça-palavras, discriminação de sombras e labirintos.

Aliás, labirintos não deveriam faltar em casa. Além de ajudar na concentração, estimulam a coordenação visomotora e, devido aos movimentos oculares que eles exigem, são ótimos para acalmar a ansiedade.


Promova atividades contemplativas

Excesso de estímulos, pressão e preocupações da própria família podem provocar ansiedade nas crianças e afetar a capacidade de sustentar a atenção. Colocá-las em contato com o mundo natural, estimulando um estado contemplativo, é uma forma de reduzir os níveis de ansiedade e, ao mesmo tempo, ensiná-las a observar atentamente um estímulo específico.

Mostre detalhes de flores, folhas, árvores, pedras. Ajude a criança a comparar, descrever o que está vendo ou ouvindo. Ela pode fechar os olhos para prestar mais atenção nas percepções auditivas ou táteis. A atenção, neste caso, está mais voltada às sensações, e não a informações novas, cujo processamento consome energia. Esse tipo de atividade ajuda a manter a mente no presente e a regular as emoções, facilitando a aprendizagem.